52 Peças Fáceis para Violão
Paulo Porto Alegre
Introdução
Este artigo tem por objetivo continuar a brilhante exposição que Thales Maestre fez sobre os meus ‘30 Duos Fáceis’.
Thales tem toda a razão: os meus estudos anteriores (28 Estudos por Posições, 12 Estudos Populares e 24 Estudos Modais) sempre foram considerados difíceis. Ainda que dos ‘28 Estudos Por Posições’ fossem normalmente tocados os 10 primeiros, dos 12 Estudos Populares, Solidão (Estudo nº6) e dos 24 Estudos Modais, os estudos Lídio e Eólio, eles realmente são complicados, tanto tecnicamente como musicalmente.
No mesmo ano que compus os ‘30 Duos Fáceis’, por encomenda de Jorge Elias, coordenador de violão do Projeto Guri na época, escrevi um ‘Método de Violão’ com algumas ideias diferentes. Infelizmente este método ainda não foi editado, mas escreve-lo exigiu de mim uma re-elaboração do conceito de ‘Estudo Basico’ para violão. Daí nasceram as ‘52 Pecas Fáceis’.
A Obra
Estas ’52 Peças’ têm por objetivo principal desenvolver no estudante não só a técnica básica do instrumento, como também fazê-lo desenvolver-se na linguagem da musica atual. Estão todos escritos nas primeiras posições do braço do violão, o que simplifica não só a leitura como a compreensão imediata da obra.
Sem jamais desvalorizar o material didático do passado ( em especial aquele produzido na ‘Era de Ouro’ do violão, século XIX), acredito que o trabalho com estudos modernos dirigem mais facilmente o aluno no trabalho que o levará a abordar o repertorio contemporâneo.
Acho da maior importância tocar obras dos séculos XX e XXI, nossa época. Mas a discussão deste assunto poderá ficar para outra ocasião. Vamos nos deter nas ’52 Peças’.
A obra é dividida em 6 partes, a saber:
1º) Exercícios Introdutórios ( 1-7)
2º) Elementos da Técnica Violonística (8-22)
3º) Ostinatos (23-27)
4º) Exercícios Melódicos (28-38)
5º) Intervalos (39-45)
6º) Formas Musicais (46-52)
1º) Exercícios Introdutórios (1-7)
Estabelecido um princípio de postura no estudante, começo a trabalhar através destas peças a movimentação básica dos dedos da mão esquerda.
Assim o ‘Exercício 1’ utiliza apenas o dedo 1. Na mão direita apenas pim. Há uma alteração na formula de compasso o que já acrescenta uma experiência nova para o aluno. Nada difícil.
Nos próximos estudos, acrescentarei mais dedos gradativamente. Nos Exercícios 2 e 3, utilizo os dedos 1 e 2 e o anular da mão direita faz a sua aparição.
No Estudo 4, dedos 1, 2 e 3 e uma alteração frequente de formulas de compasso podem assustar a princípio. Mas o Estudo esta escrito e uma maneira que não oferece nenhuma dificuldade adicional.
Estudos 5, 6 e 7 trabalham os quatro dedos da mão esquerda nas disposições 14-23, 13-24 e 12-34. É importante fazer-se notar que temos na mão esquerda dedos vizinhos e alternados. O trabalho entre eles é de fundamental importância para o desenvolvimento da independência.
2º) Elementos de Técnica Violonística (8-22)
Estes Estudos pretendem desenvolver os aspectos básicos de ambas as mãos na técnica do violão.
Assim, são estudos que trabalham: polegar (8 e 18, este ultimo, uma modinha), acordes (9 e 15), notas repetidas (10 e 17), ligados (11, 12, 13, 14, 19), contração de dedos (16), e arpejos e suas inversões (19, 20, 21 e 22).
Em todos estes estudos, continuo com a minha intenção de utilizar formulas de compasso não usuais para o aluno, uma sonoridade moderna (ainda que não agressiva) e elementos técnicos na sua exata dificuldade, para que não se trave a evolução técnica do estudante.
3º) Ostinatos (23-27)
Considero o ostinato um elemento essencial para o desenvolvimento da independência de dedos.
Normalmente com a repetição de um elemento melódico em uma das vozes, a outra voz pode desenvolver um contraponto em relação àquela.
Nestes ostinatos, a repetição ocorre no grave ( 23 e 25), no agudo (24-26) e na voz do meio (27-neste exercício existe um contraponto muito simples entre o grave e o agudo. A terceira voz, a do meio, faz o ostinato).
4º) Exercícios Melódicos (28-38)
No Exercício Melódico sempre existe a intenção de frasear uma melodia presente sobre um arpejo, acorde ou mesmo um contraponto.
Utilizo a inversão de vozes (do agudo para o grave) com notas repetidas (28 e 29), uma pequena marcha ‘stravinskyana’ que utiliza o tom ascendente e descendente é o motivo do Estudo 30; o numero 31 é um pequeno cânone que teria tudo para ser um mixolídio não fosse a omissão proposital da sétima, um blues com notas repetidas no meio e a melodia no agudo (34), melodia no baixo com acordes acompanhando (35), arpejos com melodia (36 e 37), acordes repetidos com uma nota melódica no agudo (38).
5º) Intervalos (39-45)
O Estudo de Intervalos é fundamental na técnica de qualquer instrumento. Trabalha-los melodicamente ou harmonicamente é uma oportunidade do aluno se desenvolver de uma maneira expressiva.
Saber digita-los é imperioso! Vemos até hoje violonistas que por não terem trabalhado intervalos da maneira correta, utilizam uma digitação incoerente, com excessivas mudanças de posição e com uma dificuldade que poderia ser muito menor se estivesse consciente pelo trabalho continuo e dirigido.
Nos Estudos, tons e semitons se alternam no nº39, alternando em ambas as vozes intervalos cromáticos e de tons inteiros. Chamo o nº40 de ‘tercinhas’, já que a ideia aqui é de terças acompanhando no grave melodias agudas e depois invertendo, terças agudas com uma melodia no grave. Um pouco irônico talvez...
O Estudo de Quartas (41) é o mais dissonante e difícil. Exige uma perfeita postura de mão esquerda com relaxamento total a cada mudança de posição.
O nº42 é sobre acordes em quintas, o que permite o estudo das separações de dedos da mão direita.
Ironicamente, chamei o nº43 de ‘sextas picantes’ (revisitando Carcassi). Nele está presente integralmente o pequeno estudo em sextas de M.Carcassi, com algumas notas cromáticas acrescentadas provocando uma certa tensão. Talvez uma pequena vingança pela quantidade de vezes que já ouvi esse estudo em minha vida.
O de sétimas (44) trabalha sétimas maiores, menores e diminutas.
Finalmente o estudo de oitavas tem um pedal de Sol, terceira cora solta, na voz central. Foge totalmente do trabalho de oitavas que se encontram habitualmente nos métodos tradicionais.
6º) Formas Musicais (46-52)
Aqui temos pequenas peças escritas em diversas formas: canção (46), bossa nova (47), preludio (48), baião (49), valsa (50), choro (51) e variações (52).
Sem abandonar a ideia de estudos, essas peças são um final divertido para a série. Devem ser tocadas como obras independentes de seu comprometimento técnico, porque são bastante populares e melodiosas.
Um inicio talvez para que quiser futuramente se dedicar à musica instrumental popular, uma de nossas manifestações mais expressivas e importantes.
Final
Termino esta exposição dizendo que utilizo frequentemente as ‘52 Peças Fáceis’ com meus alunos.
Esta obra tem se revelado bastante pratica e completa para promover o crescimento de nosso jovens violonistas. Foram pensadas neles: durante meus 40 anos de magistério pude reparar como a falta de um material moderno e eficaz tem se revelado danoso na formação do jovem. Nota-se frequentemente a dificuldade com a musica moderna (inclusive em aceita-la), com a musica popular, idem, e a fixação num repertorio de baixa qualidade musical que se vale apenas do malabarismo técnico, quando se alcança este nível... É só ver o que é pedido normalmente no repertorio musical de concursos, que tanto fascina a juventude pelo seu apelo mais atlético do que musical.
Como disse no começo, não tenho nada contra o material didático tradicional. É ótimo! Mas não deve ser ministrado como única referencia musical. Estudar por muito tempo um repertorio de qualidade duvidosa, forma o gosto musical deste aluno, distanciando-o assim de algo moderno ou mais interessante.
Procurei dar a melhor qualidade musical a este pequenos estudos. Todos sabem que escrever musica fácil e com qualidade é muito difícil.
Espero com estas ’52 Peças Fáceis’ ter contribuído de alguma maneira para a formação de nosso alunos.
Incentivar o interesse pelo novo, é a única maneira possível de progredir. Afinal, é para frente que se anda...
P.S.: Estou anexando o Estudo L (Valsinha) como exemplo.
A obra inteira está disponível gratuitamente no meu website: www.pauloportoalegre.com